Extracto da primeira entrevista da TASKFORCE ECCO COVID-19,
publicada a 13 de Março
O objetivo deste documento é fornecer aos profissionais de saúde algumas informações sobre os melhores cuidados de saúde que podem oferecer aos nossos pacientes em geral e em particular àqueles sob tratamento de imunossupressivos/ imunomodeladores durante a actual situação do Covid-19. Devido à ugência, a ECCO sugeriu reunir um grupo de gastroenterologistas com especial interesse em infecções oportunistas e peritos em doenças infeciosas, para que possam dar orientações regularmente para os médicos da comunidade ECCO.
Estas orientações não deverão nunca substituir as orientações das autoridades nacionais de saúde e deverão ser vistas como uma fonte adicional de informação que será atualizada quando necessário, na base do nosso melhor entendimento sobre esta nova doença.
O formato utilizado é de uma entrevista com gastroenterologistas e peritos em doenças infecciosas de vários locais na Europa e revisto pela Taskfoece ECCO COVID-19. A Taskfoece ECCO COVID-19 é composta por membros do grupo de Consenso de orientações de infecções oportunistas e membros do Grupo de Administração da ECCO, e peritos em doenças infeciosas.
PERGUNTAS e RESPOSTAS
O Covid-19 pode simular ou despoletar uma crise de DII?
De acordo com a evidência clinica e científica, os sintomas mais comuns para o Covid-19 são febre, fadiga, tosse seca, dores musculares e dificuldades respiratórias. Podem também surgir dores absominais, diarreia, nauseas e vómitos, embora com menos frequência.
A família do coronovírus provoca tanto doenças respiratórias como gastrointestinais. O SAR-CoV-2 está presente em quantidades substanciais em fezes de pessoas com Covid-19. Um relatório recente evidenciou que a diarreia foi o sintoma inicial de Covid-19, num jovem paciente masculino. Este caso sublinhou o potencial envolvimento do sistema gastrointestinal na transmissão do SARS-CoV-2. A atual evidência não suporta o Covid-19 como causador de infeções gastrointestinais. Contudo, esta situação não será de todo inesperada, uma vez que mesmo sem causar infeções gastrointestinais, o H1N1v esteve associado a crises moderadas durante a primeira semana de infeção viral, sobretudo em doentes com Colite Ulcerosa.
Devemos desencorajar os pacientes com DII, com doença estável, de ir ao Hospital?
Sim, se o Covid-19 estiver disseminado na comunidade. As estatísticas disponíveis são elucidativas: no início da epidemia em Wuhan, na China, de 138 pessoas infectadas, 57 (41,3%) foram presumivelmente infetadas no hospital. Destes, 40 eram profissionais de saúde e 17 doentes hospitalizados por outras razões. Por isso, doentes com DII devem ser avisados para:
1) Ter medicação suficiente em casa, se possível;
2) Mudar para injeções subcutâneas para evitar visitas ao hospital;
3) Limitar as saídas de casa;
4) Evitar multidões, dentro do possível.
Em zonas com múltiplos casos importados ou transmissão local limitada, onde a vigilância esteja ativa e a capacidade de teste seja eficaz, o risco é considerado de baixo a moderado (pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças). No caso de consultas/ exames críticos no hospital, os pacientes com DII deverão ser aconselhados a pôr em prática as medidas preventivas para o Covid-19: lavar as mãos com frequência; tossir ou espirrar num lenço e deitá-lo fora e lavar/ desinfetar as mãos de seguida; evitar contacto próximo com outras pessoas. O meio de transporte dos pacientes para o hospital é igualmente importante: pacientes deverão evitar autocarros e comboios, sobretudo em horas de ponta. A idade é um fator igualmente importante, pelo que idas ao hospital devem ser desencorajadas para pessoas mais velhas.
Os pacientes com DII a fazer um tratamento imunossupressor ou imunomodelador estão em risco acrescido de serem contaminados com Covid-19? Ou em risco de terem consequências mais graves caso fiquem contaminados?
Os pacientes com DII não estão em maior risco de serem contagiados com o Covid-19 e os dados sobre pacientes imunodeprimidos ou a fazer imunomedeladores e a infeção através do SARS-Cov-2 são bastante escassos. Os idosos e aqueles com comorbidades (doenças cardiovasculares, diabetes, doença respiratória crónica, hipertensão e cancro) estão em risco de uma infeção mais severa e com taxas de letalidade mais elevadas do que aqueles sem comorbidades. O risco de infeções severas (como as infeções respiratórias) é ligeiramente maior em pacientes sobre tratamento imunossupressor ou biológico, e é esperado que o mesmo aconteça com infeções pelo SARS-CoV-2. Apesar dos números serem anda limitados, parece que grupos com imunossupressão relativa, como as crianças muito jovens, mulher grávidas e pacientes com HIV, não parecem estar em risco mais elevado de complicações. Particular atenção deve ser dada a fumadores, para os quais existe evidência de alta suscetibilidade ao Covid-19. Isto está provavelmente relacionado com o facto que o tabaco aumenta a expressão genética de uma proteína cuja presença no sangue promove a secreção de aldosterona no sangue que pode dar origem a elevar a pressão arterial, ligando o recetor para este vírus.
Como podemos reduzir o risco dos nossos pacientes com DII de serem contagiados pelo Covid-19?
Como o SARS-CoV-2 se replica de forma eficiente no trato respiratório superior, indivíduos infetados produzem uma larga quantidade de vírus nesta região durante o período de incubação. Nesta fase, devido à ausência de sintomas, os indivíduos mantêm as suas atividades habituais, contribuindo para o contágio.
Como ainda não está disponível uma vacina, a exposição ao SARS-CoV-2 é a chave para diminuir o risco de infeção.
As medidas gerais de prevenção são:
– Evitar contacto com pessoas infetadas;
– Evitar tocar nos olhos, nariz e/ ou boca com as mãos por lavar;
– Lavar as mãos com frequências com sabão/ sabonete e água, durante pelos menos 20 segundos e/ ou usar desinfetante para as mãos com 60 a 90% de álcool.
Este procedimento é particularmente importante depois de ir à casa de banho, antes de comer, depois de tossir, espirrar ou assoar o nariz. Sabão/ sabonete e água deve ser usado se as mãos estão visivelmente sujas. Sempre que possível, tratamento com esteroides deve ser revisto, uma vez que podem aumentar o risco de infeção severa.
Os pacientes com DII devem parar os tratamentos imunossupressores/ imunomodeladores durante a infecção pelo Covid-19?
Devido ao período que demora a maioria dos imunossupressores a saírem totalmente do corpo (como a aziotropina e o mexotrato) e os biológicos, a suspensão de tratamento imunossupressor/ imunomodelador não é muito útil nos casos leves ou moderados de doença provocada pelo Covid-19.
Uma exceção é feita para os corticoidesteroides: os dados disponíveis sugerem um aumento da mortalidade e taxas de infecção secundária em infecções por influenza e depuração comprometida pelo SARSCoV e MERS-CoV, juntamente com complicações da terapia com corticosteróides em sobreviventes. Em relação à infeção por SARSCoV-2, os esteróides não foram eficazes para o tratamento de lesão ou choque pulmonar. Neste contexto, a suspensão da terapia com esteroides será recomendada.
Em pacientes graves e críticos, o risco de mais efeitos colaterais e mais interações medicamentosas em pacientes em tratamento imunossupressor / imunomodulador deve ser considerado e avaliado. Nestes casos, a suspensão destes medicamentos provavelmente seria aconselhável.
Caso vivam numa zona endémica, os pacientes com DII deverão para de tomar os tratamentos imunossupressores e/ ou imunomodeladores?
A evidência atual não apoia a suspensão do tratamento em pacientes que vivem numa área endémica nem foram recomendadas antes em situações semelhantes, principalmente durante a infeção por SARS-CoV ou a pandemia de H1N1v. No entanto, estratégias de mitigação para reduzir o risco durante terapias de infusão, em hospital de dia, devem ser implementadas. A decisão pode ser diferente no caso de iniciar o tratamento imunossupressor / imunomodulador. Sempre que possível, durante a epidemia de COVID-19, o tratamento deve ser adiado com base em uma avaliação de risco individual.
Os pacientes com DII devem parar de tomar tratamento imunossupressor / imunomodulador ou tomar outras medidas se tiverem contato próximo com alguém com infeção comprovada por COVID19?
No caso de um contacto próximo com uma pessoa infetada com COVID-19 comprovada, os pacientes com DII devem ser seguidos de acordo com as recomendações nacionais, como qualquer outra pessoa. O isolamento social é um fator-chave, sendo crucial o acompanhamento cuidadoso e a avaliação médica imediata em caso de desenvolvimento dos sintomas. O Ro para COVID19 (o número de pessoas que um paciente com COVID-19 pode infetar) é estimado em 2,5, e focos de contaminação são comuns. Ao contrário do SARS-CoV, a transmissão do SARS-CoV-2 pode ocorrer durante o período de incubação quando os infetados estão levemente doentes e realizam atividades usuais, o que contribui para a disseminação da infeção. No entanto, os dados sobre os efeitos da suspensão do tratamento são escassos e não parece razoável interromper a medicação.
O que devo aconselhar a pacientes com DII que desejam viajar para áreas endémicas?
Os pacientes com DII devem ser desencorajados a viajar para áreas endémicas, nas quais a transmissão pela comunidade é evidente. Em 8 de março de 2020, o Centro de Controlo de Doenças do EUA, aconselhou os viajantes, especialmente aqueles com condições médicas subjacentes, a “adiar todas as viagens de navios de cruzeiro em todo o mundo”, dado o aumento do risco de transmissão de SARS-CoV-2 de pessoa para pessoa. Os idosos e aqueles com problemas de saúde devem evitar locais lotados, voos longos e outras situações potencialmente de alto risco.
Entrevista realizada pela Prof. Dr.ª Cândida Abreu, Hospital de São João do Porto, Departamento de Doenças Infecciosas, pela Task Force COVID-19 ECCO
Nota: Uma vez que a infeção é dinâmica e o conhecimento e a evidência estão a crescer rapidamente, algumas destas orientações serão atualizadas regularmente para cada região, de acordo com a melhor evidência disponível.
Dois projetos independentes foram recentemente lançados para aumentar o nosso conhecimento desta nova doença e o impacto nos doentes com DII. Encorajamos a que participem!
O primeiro projeto é um inquérito da ECCO para melhor compreensão e entendimento de cada um sobre a situação atual. A pandemia do coronavirus é um tempo difícil para todos, incluindo médicos e pacientes com DII. Nenhum de nós experienciou algo similar, que requer lidar com situações complexas, para as quais temos pouco ou nenhum conhecimento, e que evolui diariamente.
Por este motivo, convidamos a que participem num pequeno inquérito sobre a vossa gestão atual dos medos e das dificuldades que estão a enfrentar diariamente neste difícil e sério contexto global. Este inquérito demorará apenas alguns minutos e pedimos que respondam antes do dia 20 de Março tendo em conta o corrente contexto de emergência.
O projeto está acessível através do seguinte link: https://survey.ecco-ibd.eu/index.php/433996?lang=en
O segundo projeto é uma iniciativa global da Organização Internacional para o Estudo da DII (IOIBD em inglês) para registar em tempo útil casos confirmados de Covid-19 em doentes com DII. Encorajamos ao corpo clínico de todo o mundo para reportar TODOS os casos de Covid-19 nos seus pacientes com DII, independentemente da severidade dos sintomas (incluindo pacientes assintomáticos detetados através de exames de saúde pública).
Reportar um caso a este mecanismo registro da Vigilância Epidemiológica do Coronavirus sob a Pesquisa de Exclusão (SECURE)-IBD demora cerca de 5 minutos.
Com a colaboração de toda a comunidade DII, poderemos rapidamente definir o impacto do Covid-19 em pacientes com DII e fatores como idade, comorbidades e tratamentos da DII impactam os resultados finais do Covid.
Este projeto está acessível no seguinte link: https://covidibd.web.unc.edu/
Informação disponibilizada pela ECCO: https://ecco-ibd.eu/publications/covid-19.html
Tradução responsabilidade do Doença de Crohn/ Colite Portugal.